Um fim, um começo (conto)

Roberto Cassano
2 min readMar 15, 2022

Os irmãos brincavam com uma bola enquanto ela fechava as malas. 4 volumes, um para cada membro da família. É tudo que levariam de seu planeta cada vez mais desértico. Ergueu os olhos para além da redoma de vidro, instalada há muito tempo, quando se percebeu que a deterioração do clima era irreversível. Uma tempestade de areia vermelha se erguia no horizonte.

Procurou pelo marido, que ainda não tinha retornado do espaçoporto, de onde partiriam para a nova casa. A bola bateu em seus pés. Os meninos estavam agora sobre umas caixas, mãos em forma da aba de um boné sobre os olhos, espreitando o céu azulado do anoitecer que começava a pipocar de estrelas.

- É qual delas, mamãe?

- É aquela na direção do Sol poente, a mais azulada.

- É tão pequena. Vai caber todo mundo?

Ela riu, algo que não fazia há muito tempo. Eles eram os últimos a deixar o planeta moribundo, cada vez mais desértico e desolado. Preocupava o casal, mais do que a solidão de ter ficado para trás, por serem cientistas-chefes da missão de evacuação planetária, a angústia de não terem recebido qualquer comunicação de retorno das muitas naves que partiram antes deles para o planeta vizinho.

- Sim, vai caber. Na verdade, é um planeta maior que o nosso, mas inabitado. Vocês vão adorar. É muito parecido com nosso próprio mundo, mas como ele era tempos atrás, cheio de verde e água.

As crianças seguiram olhando o céu, incrédulos. Ela também se corroía pela insegurança e medo. Nenhum sinal das expedições anteriores.

Haviam decidido mudar o lugar de pouso, um outro continente no novo planeta. Provavelmente nunca mais encontrariam outros de seu povo. Mas se o local dos pousos anteriores oferecia algum perigo, o que explicaria o silêncio por tanto tempo, a família teria mais chances de encontrar um lugar mais amistoso para reiniciar a longa caminhada da espécie.

Empilhou as malas fechadas sobre um carrinho. O céu já estava totalmente escuro e estrelado. Pouco se via das dunas e rochas avermelhadas fora da redoma. Um silêncio mortal imperava, quebrado somente pela voz do marido, que retornava do espaçoporto.

- Eva, a nave está pronta. Podemos partir.

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